quinta-feira, 29 de dezembro de 2022

8ª Turma mantém reconhecimento de vínculo de motorista de Uber

 

20/12/22 - A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o exame de recurso da Uber do Brasil Tecnologia Ltda. contra decisão que reconheceu o vínculo de emprego de uma motorista do Rio de Janeiro (RJ). Segundo o relator, ministro Agra Belmonte, a relação da motorista com a empresa é de subordinação clássica, pois ela não tem nenhum controle sobre o preço da corrida, o percentual do repasse, a apresentação e a forma da prestação do trabalho. “Até a classificação do veículo utilizado é definida pela empresa, que pode baixar, remunerar, aumentar, parcelar ou não repassar o valor da corrida”, ressaltou.

A motorista trabalhou para a Uber entre 2018 e 2019. Segundo ela, sua remuneração mensal era de cerca de R$ 2.300, e seus gastos com combustível e manutenção do automóvel eram de R$ 500. Além do vínculo, ela pediu, na reclamação trabalhista, horas extras, ressarcimento desses valores e indenização por danos extrapatrimoniais.

 

Subordinação algorítmica

O pedido foi julgado improcedente pelo juízo de primeiro grau. Após a sentença, foi apresentada uma proposta de acordo pelo qual a motorista receberia R$ 9 mil a título de indenização e desistiria do seu recurso ordinário. Mas o Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região não homologou o acordo, por entender que seus termos eram inadequados, e reconheceu o vínculo de emprego. 

A decisão levou em conta que a lei, acompanhando a evolução tecnológica, expandiu o conceito de subordinação clássica, a fim de alcançar os meios informatizados de comando, controle e supervisão. “O que a Uber faz é codificar o comportamento dos motoristas, por meio da programação do seu algoritmo, no qual insere suas estratégias de gestão, e essa programação fica armazenada em seu código-fonte”, concluiu. 


Litigância manipulativa

Ao analisar o agravo pelo qual se pretendia rediscutir a não homologação do acordo, o ministro Agra Belmonte ressaltou que, segundo o TRT, a empresa vem se utilizando de um expediente conhecido como “litigância manipulativa” - o uso estratégico do processo para evitar a formação de jurisprudência sobre um tema (no caso, o vínculo de emprego). Um dos aspectos da prática é a celebração de acordo apenas nos casos em que houver a expectativa de que o órgão julgador vá decidir em sentido contrário ao seu interesse. 

Na conclusão do ministro, a finalidade do acordo proposto pela Uber não foi a conciliação em si, como meio alternativo de solução de conflitos, “mas um agir deliberado, para impedir a existência, a formação e a consolidação da jurisprudência reconhecedora de direitos trabalhistas aos seus motoristas”. Essa conduta, a seu ver, configura abuso processual de direito.

 

Uberização

Em relação ao vínculo de emprego, o relator observou que a nova modalidade de prestação de serviços de transporte individual, mediante uma “economia compartilhada”, embora tenha inserido uma massa considerável de trabalhadores no mercado, também é caracterizada pela precariedade de condições de trabalho, com jornadas extenuantes, remuneração incerta e submissão direta do próprio motorista aos riscos do trânsito. “Doenças e acidentes do trabalho são capazes de eliminar toda a pontuação obtida na classificação do motorista perante o usuário e perante a distribuição do serviço feita automaticamente pelo algoritmo”, exemplificou. 

Na avaliação do relator, os princípios da livre iniciativa e da ampla concorrência “não podem se traduzir em salvo-conduto nem em autorização para a sonegação deliberada de direitos trabalhistas”.


Controle do meio produtivo

Para Agra Belmonte, a expressão “subordinação algorítmica” apontada pelo TRT é uma “licença poética”. “O trabalhador não estabelece relações de trabalho com fórmulas matemáticas ou mecanismos empresariais, e sim com pessoas físicas ou jurídicas detentoras dos meios produtivos”, assinala. E, nesse sentido, a CLT (artigo 6º, parágrafo único) estabelece que os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos. 

“A Uber não fabrica tecnologia, e aplicativo não é atividade. É uma transportadora que utiliza veículos de motoristas contratados para realizar o transporte de passageiros”, afirmou o relator. “Basta ela deslogar o motorista do sistema para que ele fique excluído do mercado de trabalho. Basta isso para demonstrar quem tem o controle do meio produtivo”, concluiu.

A decisão foi por maioria, vencido o ministro Alexandre Ramos, que compunha o quórum da Oitava Turma.

 

Divergências

A questão do vínculo de emprego entre motoristas e plataformas de aplicativos ainda é objeto de divergência entre as Turmas do TST. A matéria já está sendo examinada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), órgão responsável pela uniformização da jurisprudência das Turmas. Dois processos com decisões divergentes começaram a ser examinados em outubro, e o julgamento foi interrompido por pedido de vista, após sugestão do atual vice-presidente do TST, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, de que o tema seja submetido à sistemática dos recursos repetitivos.

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho

domingo, 25 de dezembro de 2022

Está perto de se aposentar? Quais as regras hoje e o que muda em 2023

 

Aposentadoria por idade: Nada muda para homens.

No caso de mulheres, o pedido de aposentadoria poderá ser feito por quem tiver 62 anos de idade e 15 anos de contribuição. A idade mínima não sobe mais a partir de 2023.

Regra dos pontos: O tempo de contribuição mínimo é de 30 anos para mulheres e de 35 para homens. O trabalhador deve somar o tempo de contribuição com a idade. Em 2022, as mulheres devem somar 89 pontos, e homens, 99 pontos.

Por exemplo, um homem com 35 anos de contribuição e 64 anos de idade pode se aposentar porque os dois números somam 99.

Em 2023, homens vão precisar chegar a 100 pontos, e mulheres a 90 pontos.

Regra da idade progressiva: neste ano, se o homem completar 35 anos de contribuição, e a mulher 30 anos, é possível se aposentar se tiverem a idade mínima exigida. Para homens é de 62,5 anos, e para mulher 57,5 anos;

A idade mínima sobe seis meses a cada ano. Em 2031, por exemplo, será de 65 anos para homens e 62 anos para mulheres;

Em 2023, os períodos de contribuição continuam sendo de 30 e 35 anos, respectivamente, mas há uma mudança na idade mínima. Homens precisam ter 63 anos, e mulheres, 58 anos.

Fonte: INSS

           Uol Economia


quarta-feira, 21 de dezembro de 2022

Empresas conseguem afastar revelia por atraso de quatro minutos à audiência

 

02/12/22 - A Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho afastou a revelia aplicada à Cidade Jardim Turismo e Fretamento Ltda., de Serrana (SP), e Andréia Rosa Transportes, de Batatais (SP), pelo fato de seus representantes terem comparecido à audiência de instrução processual quatro minutos depois do horário marcado. Na avaliação do colegiado, o atraso foi muito pequeno e não acarretou prejuízo às partes.

 

Ação

A ação foi ajuizada por um motorista de ônibus de Altinópolis (SP), que pedia o reconhecimento da unicidade contratual em relação às duas empresas, do mesmo grupo econômico. Pretendia, ainda, receber indenizações por danos morais e materiais, diferenças salariais a título de acúmulo de função como mecânico e eletricista, adicional de insalubridade e periculosidade e horas extras, entre outras parcelas.

 

Revelia 

O juiz da Vara do Trabalho de Batatais (SP) declarou a revelia das empresas, situação que ocorre quando o réu é notificado de um processo judicial e não se defende, porque seus representantes não estavam no local no início da audiência inaugural, aberta às 14 horas. Na prática, isso implicou o reconhecimento de que os fatos narrados pelo motorista eram verdadeiros. Assim, parte de seus pedidos foi julgada procedente. 

 

Direito de defesa

As empresas recorreram ao Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP), com o argumento de que tiveram o seu direito de defesa cerceado. Sustentaram que a advogada e seus representantes haviam chegado às 14h04 na sala de audiência, mas a pena de confissão já havia sido aplicada, e o motorista já tinha ido embora. 

O TRT, contudo, manteve a decisão, por entender que não há previsão legal de tolerância de horário para partes, testemunhas e demais pessoas que devem comparecer à audiência de instrução. Logo, todos precisam observar a hora marcada.   

 

Atraso ínfimo

A relatora do recurso de revista das empresas, ministra Kátia Arruda, verificou que o único ato praticado na audiência foi, justamente, a aplicação da pena de confissão às empresas pelo atraso. Ela explicou que, embora a Orientação Jurisprudencial (OJ) 245 da Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) disponha que não há previsão legal de tolerância para o atraso,  a jurisprudência do TST tem afastado esse entendimento quando o atraso é de poucos minutos e não tenha sido praticado nenhum ato processual de modo a causar prejuízo às partes. 

Ainda na avaliação da relatora, devem ser prestigiados os princípios da informalidade, da simplicidade e da razoabilidade que regem o processo do trabalho. Como, no caso, não há registro de prejuízo às partes, deve-se considerar ínfimo o atraso de quatro minutos. 

Agora, o processo retornará à Vara do Trabalho de Batatais para prosseguir a instrução processual.

A decisão foi unânime.


Empregada doméstica perde direito à justiça gratuita por não comprovar carência financeira

 

13/12/22 - A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou o benefício da justiça gratuita a uma empregada doméstica de Alfenas (MG) que também havia sido multada por litigância de má-fé. O indeferimento ocorreu porque ela não comprovou a insuficiência de recursos para arcar com as despesas processuais, e não pelo fato de ela ter recebido a penalidade. 

 

Vínculo de emprego

Na ação, ajuizada em março de 2019, a trabalhadora disse que fora contratada para fazer a limpeza da “Estação Cafezal em Flor”, imóvel rústico destinado a locação para festas e eventos, onde teria prestado serviços de novembro de 2013 a outubro de 2017. De acordo com seu relato, ela não teve a carteira de trabalho registrada pelo empregador nem recebeu parcelas relativas a adicional de insalubridade, férias, 13º salário e horas extras, além do FGTS. 

Em defesa, o suposto patrão argumentou que não tinha nenhum vínculo com o local e que a doméstica era esposa do caseiro do “Rancho Fundo”, outro imóvel alugado para eventos, mas jamais lhe prestara serviços. Segundo ele, o caseiro também havia ajuizado ação com algumas alegações idênticas e outras que se contradiziam.

 

Litigância de má-fé 

O juízo da Primeira Vara do Trabalho de Alfenas negou os pedidos, entre eles o benefício da gratuidade de justiça, e ainda condenou a mulher ao pagamento de multa, fixada em 10% do valor da causa, por litigância de má-fé. O juiz destacou que a autora, no depoimento pessoal, havia contrariado as alegações que fizera na petição inicial do processo e concluiu que ela, a fim de obter recursos de uma condenação injusta e descabida, havia modificado a verdade dos fatos de maneira inconsequente. 

O Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região (MG) manteve a condenação. 

 

Regras próprias

No recurso de revista encaminhado ao TST, a autora sustentou que a aplicação da multa por litigância de má-fé não impede o deferimento da justiça gratuita, pois são institutos distintos.

O relator, ministro Breno Medeiros, ao analisar o apelo, explicou que as duas matérias têm regras específicas e que não há impedimento legal para a concessão da gratuidade nessa circunstância. Ele observou que a ação fora ajuizada na vigência da Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017) que trata, no artigo 793-C da CLT, sobre a multa por litigância de má-fé, sem apontar qualquer conflito entre a má-fé processual e o acesso à justiça gratuita.

Entretanto, o ministro ressaltou que, de acordo com o entendimento da Quinta Turma, não basta a mera declaração da parte de que não tem condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do seu sustento e o da família para a concessão da justiça gratuita. É preciso a efetiva comprovação da carência financeira, seja por receber salário inferior a 40% do teto do Regime Geral de Previdência Social, seja por se encontrar desempregada. No caso,  porém, a empregada doméstica não demonstrou sua insuficiência de recursos. 

A decisão foi unânime. 

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho


Vendedora de farmácia em posto de gasolina receberá adicional de periculosidade

 

14/12/22 - A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho concedeu o adicional de periculosidade a uma vendedora de uma loja da Drogaria Araújo S.A. localizada na área de conveniência de um posto de combustível de Belo Horizonte (MG). Ela prestava serviços a menos de 7,5 metros das bombas de abastecimento, em área considerada de risco.

 

Abastecimento

O pedido de pagamento da parcela havia sido parcialmente acatado pelo juízo da 14ª Vara do Trabalho da capital mineira. A decisão, no entanto, foi reformada pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, que entendeu que não é apenas a distância da bomba que caracteriza a área de risco. Para o TRT, o Anexo 2 da Norma Regulamentadora (NR) 16 do Ministério do Trabalho considera de risco apenas a área de abastecimento e está vinculada a essa operação. 

 

Área de risco 

Para a relatora do recurso de revista da vendedora, ministra Delaíde Miranda Arantes, não há exigência legal de que o adicional só seja devido a quem opere no abastecimento de veículos e tenha contato direto com os inflamáveis. Ela assinalou que, de acordo com a jurisprudência do TST, ele deve ser pago, também, aos empregados que trabalham em escritório de vendas instalado a menos de 7,5m da bomba de abastecimento. 

No caso, a empregada trabalhava, durante toda a jornada, a 7,3 m da bomba mais próxima, ou seja, a exposição aos riscos de inflamáveis não era eventual, fortuita ou por tempo extremamente reduzido. Logo, ela tem direito à parcela no percentual de 30%. 

A decisão foi unânime.


Fonte: Tribunal Superior do Trabalho


sábado, 19 de novembro de 2022

TST afasta vínculo entre entregador e distribuidora de bebidas

 

16/11/22 - A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho afastou o vínculo de emprego direto de um distribuidor de bebidas de Recife (PE) com a Ambev S.A. Para o colegiado, a terceirização do serviço de entrega de bebidas é lícita, assim como o contrato de trabalho celebrado com a empresa de transporte de mercadorias que prestava serviços à companhia de bebidas. 

 

Terceirização ilícita

Na Justiça do Trabalho, o empregado disse que tinha sido contratado pela Horizonte Express Transportadora Ltda. para entregar bebidas na região de Recife. Seu argumento era o de que desempenhava atribuições ligadas à atividade-fim da Ambev.  

Além de outras diferenças salariais, ele pedia o reconhecimento da ilegalidade da terceirização de mão-de-obra, a declaração de nulidade do seu contrato de emprego com a transportadora e a formação de vínculo empregatício direto com a indústria. 

A companhia de bebidas, por outro lado, sustentou que os serviços de transporte de mercadorias não estavam inseridos na sua atividade finalística. 

 

Responsabilidade subsidiária

O juízo da 3ª Vara do Trabalho de Olinda (PE) considerou lícito o contrato de emprego do distribuidor com a transportadora, mas reconheceu a responsabilidade subsidiária da Ambev pelos créditos salariais devidos a ele. O Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região (PE), por seu turno, manteve esse ponto da sentença, por entender que os serviços terceirizados à transportadora não se enquadravam nas atividades-fim da companhia de bebidas, embora fizessem parte da sua dinâmica empresarial. 

 

Processo produtivo

Ao julgar o recurso de revista do trabalhador, porém, a Terceira Turma do TST considerou ilícita a terceirização e reconheceu o vínculo de trabalho diretamente com a Ambev, com fundamento no item I da Súmula 331 do TST. Na avaliação da Turma, a entrega de mercadorias estava inserida na estrutura organizacional e no processo produtivo da tomadora do serviço. 

 

Orientação do STF

Coube ao ministro Hugo Scheuermann examinar os embargos da empresa à SDI-1. Ele lembrou que, no julgamento de duas ações (ADPF 324 e RE 958.252),  o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é lícita a terceirização ou qualquer outra forma de divisão do trabalho entre pessoas jurídicas distintas, independentemente do objeto social das empresas envolvidas. Sendo assim, não havia como julgar ilícita a contratação dos serviços da transportadora. 

Ainda segundo o relator, a subordinação estrutural dos empregados da prestadora de serviços à supervisão da tomadora é inerente a todo contrato de terceirização, mas isso não se confunde com a subordinação caracterizadora do vínculo de emprego.

A decisão foi maioria de votos. 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho

terça-feira, 15 de novembro de 2022

Atendente dispensada quando investigava câncer de mama deve ser reintegrada

 A Energisa Mato Grosso do Sul – Distribuidora de Energia S.A. terá de reintegrar uma atendente de Corumbá que havia sido dispensada quando fazia tratamento para investigar a ocorrência de câncer de mama. A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou o recurso da empresa, por entender que as provas existentes no processo confirmaram que a doença motivara o desligamento. 

 

Dispensa

Na ação, a atendente disse que fora contratada pela Energisa em janeiro de 2009 e foi dispensada em junho de 2019. Desde 2018, ela vinha se submetendo a investigações sobre câncer de mama, doença que havia causado a morte de sua mãe, e, na época da dispensa, investigava um nódulo. 

O diagnóstico acabou se confirmando, levando-a a requerer a nulidade da dispensa, a reintegração e o restabelecimento do plano de saúde para que pudesse dar continuidade ao tratamento da doença. Pediu, ainda, o pagamento dos salários do período em que ficara afastada e indenização por danos morais no valor de R$  105 mil.  

 

Reorganização

A empresa, por sua vez, defendeu que a atendente fora dispensada em razão da reorganização do quadro empresarial, e não por discriminação. Entre outros pontos, a Energisa alegou que a empregada não tinha sido afastada pelo INSS nem apresentado “um simples atestado médico comprovando sua possível situação”. Ainda, de acordo com a empresa, no momento da demissão, o problema de saúde “era hipotético” e não tinha relação com o contrato de trabalho. 

 

Direito de demitir limitado

A juíza da Vara do Trabalho de Corumbá (MS) reconheceu que a dispensa foi discriminatória e determinou a reintegração imediata da atendente. Também condenou a Energisa a pagar R$ 10 mil a título de reparação. A julgadora ressaltou que o poder de demitir do empregador não é absoluto nem pode estar dissociado da função social do trabalho e do direito à vida, à dignidade da pessoa humana e à não-discriminação. 

O Tribunal Regional do Trabalho da 24ª Região (MS) seguiu na mesma linha por entender que a empresa não pode descartar uma empregada por motivo de doença depois de se beneficiar dos seus serviços. O TRT constatou que a atendente era considerada ótima funcionária e que seu chefe imediato sabia da doença. Uma testemunha confirmou que somente ela havia sido dispensada no setor e que outra havia sido contratada para o seu lugar.

 

Legislação protetiva

O relator do recurso de revista da Energisa, ministro Mauricio Godinho Delgado, lembrou que a legislação em vigor veda práticas discriminatórias para acesso à relação de trabalho ou de sua manutenção (Lei 9.029/1995). Em reforço, o TST editou a Súmula 443 que trata, justamente, da presunção da despedida discriminatória de empregado “portador do vírus HIV ou outra doença grave que suscite estigma ou preconceito”. Por isso a pessoa, nessas situações, tem direito à reintegração ao emprego.

Considerando as provas registradas pelo TRT, o relator destacou que elas corroboram as alegações da trabalhadora e que a empresa não conseguiu demonstrar motivos de ordem técnica, disciplinar ou financeira para a dispensa.     

A decisão foi unânime.

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho 

Gerente de farmácia que aplicava injeções receberá adicional de insalubridade

 

04/11/22 - A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho deferiu o adicional de insalubridade em grau médio a uma gerente de farmácia que aplicava injeções nos clientes de uma loja da Drogaria São Paulo S.A. em Peruíbe (SP). A decisão levou em conta o laudo técnico que constatou o trabalho insalubre e a jurisprudência do TST.

 

Injeções e testes

A empregada trabalhou na drogaria por 12 anos e foi de balconista a gerente adjunta de loja. Ela relatou, na ação trabalhista, que estava exposta a condições insalubres por aplicar injeções e fazer testes de glicemia, que envolve furar o dedo dos clientes para retirada de amostra de sangue.

 

Enquadramento

O perito concluiu que o contato com agente biológico na aplicação de injetáveis expunha a gerente a condições insalubres em grau médio. Apesar disso, o juízo de primeiro grau indeferiu o pedido, e o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) ratificou a sentença.

Conforme o TRT, as atividades exercidas por ela não se enquadram nas disposições do Anexo 14 da Norma Regulamentadora (NR) 15 do Ministério do Trabalho, pois ela não tinha contato permanente com pessoas doentes ou com material infecto-contagiante. Além disso, ressaltou que a NR 15 não inclui farmácias como locais que justifiquem a insalubridade.

 

Outros estabelecimentos

O relator do recurso de revista da trabalhadora, ministro Alberto Balazeiro, assinalou que, de acordo com o entendimento do TST, pessoas que trabalham em drogarias e aplicam injeções de forma habitual estão expostas a agentes biológicos. Portanto, é devido o pagamento do adicional em grau médio. Segundo ele, o Anexo 14 da NR15 contempla outros estabelecimentos destinados aos cuidados da saúde.

Balazeiro destacou, ainda, que o laudo técnico havia constatado o trabalho insalubre, embora essa conclusão tenha sido afastada nas instâncias inferiores. 

A decisão foi unânime.

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho

Dispensa de consultora por briga entre marido e empregador é enquadrada como discriminação de gênero

 

07/11/22 - A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a WCC Fitness Academia de Ginástica, microempresa de Taguatinga (DF), a indenizar uma consultora de vendas dispensada após um desentendimento entre seu marido, ex-gerente do local, e um dos sócios da empresa. Para o colegiado, ao ter sido dispensada sem ter praticado nenhum ato que justificasse a medida, a trabalhadora foi considerada mera extensão do homem, caracterizando discriminação de gênero.

 

WhatsApp

A consultora foi admitida em janeiro de 2016, e, no mês seguinte, seu marido foi contratado como gerente geral da academia. Porém, apenas cinco meses depois, ele saiu da empresa, após se desentender seriamente com um dos sócios. Em seguida, a trabalhadora foi demitida sumariamente, por meio de mensagem de WhatsApp enviada ao marido. Nas mensagens, o empresário escreveu: “E sua mulher não precisa ir a partir de amanhã também mais não. Está demitida. Não quero contato algum com esse tipo de gente”. 

Alegando despedida injusta e assédio moral, a consultora ajuizou reclamação trabalhista em que pediu o pagamento de indenização reparatória com base na discriminação.

A academia, em sua defesa, negou que a dispensa tivesse sido motivada por retaliação e questionou a veracidade da troca de mensagens.

 

Prova ilícita

O pedido foi negado pelo juízo da 13ª Vara do Trabalho de Brasília (DF), que considerou ilícita a conversa de WhatsApp entre o marido e o sócio como prova, porque a consultora não havia participado dela. O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região manteve a sentença, por entender que a dispensa se dera dentro do poder diretivo da empresa.

 

Recado

Para a ministra Delaíde Miranda Arantes, que proferiu o voto vencedor e redigiu a decisão, a trabalhadora foi claramente despedida por retaliação e discriminação. “Ela foi dispensada por meio de um recado”, observou. “O empregador refere-se à mulher trabalhadora, sua empregada, e ao seu marido de forma depreciativa e discriminatória, o que nem de longe se insere no seu poder diretivo”. 

 

Identidade

A ministra assinalou, também, que a dispensa demonstra total desconsideração à mulher, ignorando a sua identidade, seus direitos e seus atributos enquanto trabalhadora. “A atitude patronal busca atingir ao mesmo tempo o marido e a mulher, o que atinge também a sociedade e demonstra clara discriminação de gênero”, afirmou.  

 

Perspectiva de gênero

Em seu voto, a relatora observou que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero 2021, orientou o Poder Judiciário a ficar atento e não minimizar a relevância de certas provas com base em uma ideia preconcebida sobre gênero. O documento recomenda ao julgador “refletir sobre prejuízos potencialmente causados” e “incorporar essas considerações em sua atuação jurisdicional”, considerando, ainda, se existe “alguma assimetria entre as partes envolvidas”. 

Outro fundamento da decisão foi a Lei 9.029/1995, que proíbe qualquer prática discriminatória no ambiente de trabalho por motivo de sexo, estado civil e situação familiar, entre outros. No caso concreto, a consultora, enquanto mulher, “foi considerada mera extensão do homem, o que denota a indubitável prática de ato discriminatório”. 

Indenização

Ao estabelecer a condenação, a ministra também se baseou na Lei 9.029/1995, que faculta à empregada escolher entre a reintegração no emprego ou a indenização correspondente ao período de afastamento, em dobro. No caso, a consultora havia pedido expressamente a indenização. O valor deve ser calculado considerando o período entre a dispensa e a primeira decisão judicial que reconheceu a sua ilicitude, acrescidos de R$ 5 mil a título de danos morais.

Ficou vencido o relator do processo, ministro Aloysio Corrêa da Veiga, que entendia indevida a indenização postulada. 

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho

Financeira consegue reduzir condenação por promessa frustrada de emprego

 

03/11/22 - A Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho reduziu de R$ 300 mil para R$ 100 mil o valor da indenização que um operador da bolsa de valores, residente em Curitiba (PR), irá receber da Finaxis Corretora de Títulos e Valores Mobiliários S.A. e de outras três empresas do mesmo grupo econômico em decorrência de uma promessa frustrada de contratação. Na avaliação do colegiado, o valor precisava ser adequado aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.  

 

Promessa de emprego

Na reclamação trabalhista, o operador afirmou que fora contratado pela Petra Personal Trader Corretora de Títulos e Valores Mobiliários Ltda. (atual Finaxis Corretora), sediada em Curitiba, e dispensado em 2014. Segundo seu relato, em 2013, com o encerramento das atividades da corretora, fora convidado para trabalhar no Banco Petra, uma das empresas do grupo. Chegou a encaminhar documentos ao setor de recursos humanos do banco e participar de reuniões, mas foi surpreendido com a dispensa. 

Na ação, pediu a reintegração no emprego e indenização por danos morais. Seu argumento era o de que havia se desfeito de sua carteira de clientes e deixado de se recolocar em outra empresa em razão da promessa de contratação que acabou não se efetivando.

 

Direito à indenização

Na 18ª Vara do Trabalho de Curitiba (PR), o corretor não conseguiu a reintegração pretendida, mas obteve indenização de R$ 100 mil em decorrência da contratação frustrada. 

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) reformou a sentença para aumentar o valor da condenação para R$ 300 mil, levando em conta a extensão do dano causado ao profissional e o caráter pedagógico da reparação. Segundo o TRT, a expectativa de novo emprego levou-o a se desfazer de sua carteira de clientes, conquistada ao longo de anos no mercado de ações, e o impediu de ter uma alternativa imediata ao desemprego.  

 

Valor desproporcional

A relatora do recurso de revista das empresas, ministra Delaíde Miranda Arantes, explicou que, de acordo com a jurisprudência do TST, a promessa frustrada de contratação ou recontratação gera o direito à indenização por danos morais pela falsa expectativa criada no trabalhador.

Contudo, a seu ver, o valor arbitrado pelo TRT não era compatível com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. De acordo com a relatora, o julgador deve observar alguns critérios para arbitrar os montantes a título de indenização por dano moral com equidade e prudência, como a gravidade do dano, a intensidade do sofrimento da vítima, o poder econômico do réu e a razoabilidade da quantia a ser fixada.  

A decisão foi unânime. 

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho

quarta-feira, 31 de agosto de 2022

Dispensa motivada por amizade com desafetos do empregador é discriminatória

 26/08/22 - A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal Superior do Trabalho (SDI-1) considerou discriminatória a dispensa de um superintendente de águas da Indaiá Brasil Águas Minerais Ltda. em razão da amizade com ex-empregados considerados desafetos de um dos sócios da empresa. Para o colegiado, a discriminação se deu de forma indireta (em ricochete), ultrapassando o poder diretivo do empregador.

 

“Feios e gordos”

Na reclamação trabalhista, o empregado, engenheiro eletricista, disse que trabalhara na empresa por cerca de 20 anos até chegar a superintendente. Em outubro de 2012, durante suas férias, um de seus subordinados, por telefone, informou que a empresa estava buscando nomes para substituí-lo. O motivo seria o fato de ele ter postado fotos de viagem com dois ex-empregados de quem um dos diretores não gostava, alegadamente por serem “feios e gordos”, e não admitia que seus funcionários se relacionassem com eles.

Ao retornar das férias, ele disse que foi impedido de ingressar na empresa, e seus objetos pessoais foram recolhidos e entregues em sua residência em caixas de papelão. Ainda de acordo com seu relato, outros três empregados que participaram da viagem também foram dispensados.

 

Faculdade

A empresa, em sua defesa, sustentou que o ato da dispensa é uma faculdade conferida a todo empregador para encerrar um contrato de trabalho. Segundo a Indaiá, a demissão fora uma decisão financeira, e não motivada por amizades mantidas fora do ambiente de trabalho.


Intolerância

O pedido de indenização foi acolhido pelo juízo de primeiro grau, e a indenização, fixada em R$ 150 mil, foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região (CE), para o qual o caso se trata de intolerância pela amizade de empregados com os ex-empregados, cuja inimizade do sócio da empresa resultou da condição física dessas pessoas. Segundo o TRT, não se pode acreditar que quatro funcionários do primeiro escalão tenham sido dispensados “sem qualquer motivo”, ao mesmo tempo e logo após a viagem. 

 

Sem amparo legal

Ao julgar recurso de revista da empresa, a Quarta Turma afastou a condenação, por entender que não se poderia presumir, a partir da decisão do TRT, que o empregado fora vítima de ato discriminatório, pois estaria se criando uma discriminação de forma reflexa, sem amparo em lei. De acordo com o colegiado, não havia referência a sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade do empregado como motivo da dispensa, o que afastaria o enquadramento do caso na Lei 9.029/1995, que veda práticas discriminatórias nas relações de trabalho. 

Contra essa decisão, o supervisor interpôs embargos à SDI-1.

 

Caso peculiar

O relator dos embargos, ministro Aloysio Corrêa da Veiga,  ressaltou que se tratava de um caso peculiar, porque a dispensa ocorrera não por ato discriminatório contra o próprio empregado, mas por ele manter amizade com desafetos de um de seus diretores. A seu ver, essa espécie de “discriminação por ricochete” requer uma reflexão sobre os limites do poder diretivo do empregador e a amplitude da função social do contrato de trabalho e da inibição do exercício abusivo desse direito.


Poder potestativo

Segundo o ministro, o poder potestativo do empregador de dispensar empregados tem previsão no artigo 2º da CLT. Entretanto, ele está vinculado ao exercício de todas as atividades administrativas da empresa, como organizar regras de trabalho, fiscalizar e mesmo aplicar punições. “Esse poder decorre da necessidade de controlar a prestação dos serviços para o fim de conferir a produção e a qualidade do produto final do trabalho”, explicou.

No caso, contudo, a conduta empresarial de demitir o empregado em razão de suas relações pessoais atinge a dignidade e causa sofrimento. “Não há como admitir que ofensa relacionada com a qualidade física de amigos pessoais seja argumento para demissão de um empregado, quando o poder diretivo tem limite na qualidade do trabalho e no cumprimento das regras empresariais - que, no caso, não foram fundamento da dispensa, ao contrário, foram elementos de elogios para o trabalho realizado“, assinalou.

 

Vedação legal

O relator observou, ainda, que o artigo 1º da Lei 9.029/1995 veda a discriminação “por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros”. Trata-se, segundo ele, de um rol exemplificativo. “Cabe entender que a discriminação pode ocorrer de várias formas, incumbindo apenas decifrar se a intenção do empregador está vinculada ou não ao trabalho, já que nem sempre as razões efetivas são enunciadas de forma tão explícita”, ressaltou.

Para o ministro, a dispensa infundada, com fundamento na amizade do empregado com pessoa desafeta do empregador, “e, mais ainda, quando a razão da inimizade decorre de aversão descabida a características físicas dessas pessoas”, sustenta o entendimento de efetiva discriminação, que deve ser repudiada.

Com o reconhecimento da dispensa discriminatória, foi restabelecida a decisão do TRT, e o processo retornará à Quarta Turma para o exame dos demais temas do recurso. 

 

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho