7/10/2024 - A Segunda
Turma do Tribunal Superior do Trabalho determinou que uma testemunha seja
ouvida na ação por assédio sexual movida por uma trabalhadora contra seu
empregador. Para o colegiado, o fato de a testemunha também ter entrado na
Justiça contra a empresa pelo mesmo motivo não caracteriza troca de
favores.
Ao contrário, segundo a relatora, ministra Maria Helena
Mallmann, tendo em vista que a ação investiga atos ilícitos que atentam contra
a liberdade sexual, a palavra das vítimas deve ter valor de prova especial.
“Esse tipo de violência é praticado de forma velada, dificultando significativamente
sua demonstração em juízo”, ressaltou.
Supervisor forçava contato físico
Na ação, a trabalhadora, na época com 18 anos, disse que
prestava serviços terceirizados temporários, e suas atividades de separação de
materiais exigiam agachamentos constantes. Em diversas ocasiões, o supervisor
forçou contato físico aproveitando-se desse movimento. Ao reagir às investidas,
ouviu dele que ela tinha de obedecê-lo, “pois quem manda sou eu, vocês têm que
fazer tudo ao que falo”. Uma colega compartilhou sua indignação e disse ter
sofrido abordagens semelhantes.
Ela relata que informou os fatos à tomadora de serviços e pediu
transferência de setor, mas, em vez de tomar providências, a empresa a demitiu.
Tomadora de serviços disse que conduta da
trabalhadora era imatura
A prestadora de serviço, em sua defesa, alegou que a dispensa se
dera com o encerramento da demanda complementar que havia motivado a
contratação e que não tomara conhecimento dos fatos, porque apenas intermediava
a mão de obra.
A tomadora, por sua vez, negou que se tratava de assédio. “O que
se observa é uma conduta imatura da trabalhadora, normal ao primeiro emprego,
mas nunca a caracterização de conduta que dê ensejo a algo tão grave, como o
assédio sexual”, sustentou.
Testemunha disse que também foi assediada
Na audiência de conciliação, uma testemunha indicada pela
trabalhadora, confirmou os relatos da colega e disse que tinha ouvido de uma
empregada da tomadora de serviço que, se elas quisessem ser efetivadas, “teriam
que dar” para o supervisor. Ao procurar o RH, ouviu da responsável que já
tinham recebido relatos e estavam “trabalhando” com o supervisor sobre a
questão. No entanto, dias depois, as duas foram dispensadas.
A empresa questionou a validade desse depoimento, alegando que a
testemunha também tinha uma ação contra ela pelo mesmo motivo e, por isso, não
teria isenção para depor. A situação, a seu ver, caracterizava “troca de
favores”.
A juíza de primeiro grau acolheu o argumento da empresa e ouviu
a colega apenas como informante, cujo depoimento tem peso menor. Com isso,
julgou improcedente o pedido de indenização da trabalhadora, por entender que
não houve prova do assédio sexual além desse depoimento.
A sentença foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 3ª
Região (MG), com o mesmo entendimento. Para o TRT, era evidente que a
informante tinha interesse na causa, por ter ação semelhante contra a
empresa.
Para relatora, provar assédio sexual é um
desafio
Ao examinar o recurso de revista da trabalhadora, a ministra
Maria Helena Mallmann explicou que, de acordo com a jurisprudência do TST
(Súmula 357), o simples fato de uma testemunha ter ou ter tido uma ação contra
o mesmo empregador não a torna suspeita. No caso, nem a juíza nem o TRT
apontaram indícios de troca de favores.
A ministra lembrou que a comprovação do assédio sexual no âmbito
do trabalho é uma tarefa desafiadora, que exige de quem julga sensibilidade às
peculiaridades desse tipo de situação, em especial ao fato de se tratarem de
eventos traumáticos “praticados de forma furtiva, disfarçada, suscitando nas
vítimas sentimento de estigma e vergonha”. Atento a isso, o Conselho Nacional
de Justiça (CNJ) adotou o Protocolo para Julgamento com Perspectiva de Gênero.
Segundo a relatora, a adoção dessa perspectiva na Justiça do
Trabalho é de extrema importância, porque é esse ramo do Judiciário que busca
corrigir as assimetrias entre o capital e o trabalho. Para Maria Helena
Mallmann, o TRT, ao concluir que a testemunha tinha interesse na causa, deixou
de considerar o contexto em que o conflito está inserido, “marcado por fatores
sobrepostos de opressão”. Assim, a admissão da testemunha apenas como
informante cerceou o direito de defesa da trabalhadora.
Por unanimidade, a Turma determinou o retorno do caso ao TRT
para que dê eficácia plena ao depoimento da testemunha e reexamine as provas.
(Carmem Feijó)
O processo
tramita em segredo de justiça.
Fonte:
Tribunal Superior do Trabalho
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