A Quarta Turma do Tribunal Superior do
Trabalho proveu recurso de uma servidora pública de Brasília (DF) e julgou
válida a dispensa por justa causa aplicada a uma empregada doméstica grávida
que utilizou, sem autorização, produtos de beleza e higiene pessoal. Por
maioria, a Turma reformou decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª
Região (DF-TO) que condenou a empregadora ao pagamento de verbas rescisórias e
de indenização relativa à estabilidade da gestante.
A empregada foi dispensada no quinto mês de
gestação depois que a empregadora descobriu, por meio de câmeras, que, na sua
ausência, ela usava seus cremes, perfumes, batons e escova de cabelo. Um mês
após a dispensa, ela ajuizou reclamação trabalhista na 20ª Vara de Trabalho de
Brasília, que, contudo, entendeu que os motivos para a demissão estavam
inseridos na modalidade de falta grave, prevista no artigo 482, alínea “b”,
da CLT.
Art. 482 -
Constituem justa causa para rescisão do contrato de trabalho pelo empregador:
c) negociação habitual por conta própria ou alheia sem permissão do
empregador, e quando constituir ato de concorrência à empresa para a qual
trabalha o empregado, ou for prejudicial ao serviço;
d) condenação criminal do empregado, passada em julgado, caso não
tenha havido suspensão da execução da pena;
j) ato lesivo da honra ou da boa fama praticado no serviço contra
qualquer pessoa, ou ofensas físicas, nas mesmas condições, salvo em caso de
legítima defesa, própria ou de outrem;
k) ato lesivo da honra ou da boa fama ou ofensas físicas praticadas
contra o empregador e superiores hierárquicos, salvo em caso de legítima
defesa, própria ou de outrem;
Parágrafo único - Constitui igualmente justa causa para dispensa de
empregado a prática, devidamente comprovada em inquérito administrativo, de
atos atentatórios à segurança
nacional. (Incluído pelo Decreto-lei nº 3, de 27.1.1966)
Delicadeza
O Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região
(DF/TO), ao examinar recurso da empregada, entendeu que o caso não era para
justa causa. “O caso é de extrema delicadeza, não apenas por se tratar de
relação empregatícia doméstica, na qual é indiscutível a importância da
confiança que enlaça empregado e empregador, mas também porque estamos diante
de situação de estabilidade provisória gestacional”, diz a decisão.
Ainda segundo o TRT, outros requisitos para
caracterizar a falta grave, como proporcionalidade, tipicidade e punição
anterior, não foram considerados.
Fidúcia
No recurso ao TST, a servidora pública
sustentou que o TRT, ao dispensar tratamento diferenciado à doméstica em razão
da gravidez, “considerando-a inimputável", violou o princípio da isonomia.
“A falta grave praticada é única, não podendo ser relativizada em atenção a
quem a cometeu”, contestou.
A relatora do processo, ministra Maria de
Assis Calsing, votou no sentido da manutenção da condenação, entendendo que a
reversão da justa causa teve outros fundamentos, como a desproporcionalidade
entre o ato praticado e a pena e a não aplicação de penalidade intermediária.
Prevaleceu, no entanto, o voto divergente do
ministro João Oreste Dalazen. Para ele, a relação de trabalho doméstico gera um
conjunto de direitos e deveres recíprocos que exigem a boa-fé e a confiança,
pois envolve aspectos como a intimidade pessoal e familiar e a vida privada.
“Desarrazoado, desse modo, exigir-se a continuidade do vínculo de emprego após
a prática de conduta grave, apta a quebrar a fidúcia especial que informa o
contrato de trabalho doméstico”, assinalou.
Para Dalazen, a proteção à empregada gestante
garantida pelo artigo 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições
Constitucionais Transitórias (ADCT) é um direito fundamental que visa a
proteger o nascituro. “Contudo, não constitui salvo conduto para a prática de
faltas graves pela empregada gestante”, afirmou. “Reconhecida a quebra de
fidúcia contratual, decorrente da prática de conduta grave, deixa de subsistir
a garantia provisória de emprego”.
O número do processo foi omitido para preservar a
privacidade das partes.
Fonte: Tribunal Superior do
Trabalho
Nenhum comentário:
Postar um comentário