quarta-feira, 1 de outubro de 2014

Empresa é condenada por obrigar trabalhador a andar em brasas em “treinamento motivacional”

A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a um agravo com o qual a Distribuidora de Medicamentos Santa Cruz Ltda. pretendia se isentar da condenação de indenizar em R$ 50 mil um trabalhador que foi obrigado a andar com os pés descalços num corredor de carvão em brasas durante "treinamentos motivacionais". O caso causou espanto entre os ministros na sessão desta quarta-feira. O presidente da Turma, ministro Lelio Bentes Corrêa, se disse "chocado e estarrecido". "Em 12 anos de TST, nunca vi nada parecido", afirmou.
O trabalhador disse que foi obrigado, junto com outros colegas, a caminhar em um corredor de dez metros de carvão incandescente durante um evento motivacional da empresa. Alegou, ao pedir a indenização, que a participação no treinamento comprometeu não só sua saúde, mas a integridade física de todos que participaram da atividade.
A empresa confirmou que realizou o treinamento com a caminhada sobre brasas. Entretanto, disse que a atividade foi promovida por empresa especializada, e que a participação não foi obrigatória. Uma das testemunhas destacou que todos, inclusive trabalhadores deficientes físicos, tiveram que participar do treinamento e que alguns tiveram queimaduras nos pés.
Segundo a distribuidora, o procedimento não teve a "conotação dramática" narrada pelo trabalhador, e ocorreu em clima de descontração e alegria, sem nenhum incidente desagradável ou vexatório. Lembrou ainda que o treinamento foi realizado dois anos antes da reclamação trabalhista e que, assim, não seria cabível condenação por dano moral, uma vez que, na época, o trabalhador não falou nada e continuou a trabalhar para a empresa.
Ranking e fotos comparativas
Ocupante do cargo de supervisor de vendas, o trabalhador também alegou que todo mês a empresa submetia os supervisores a um ranking de vendas, em campanha intitulada "Grande Prêmio Promoções", onde o primeiro colocado tirava uma foto ao lado de uma réplica de Ferrari, e o pior colocado ao lado de um Fusca. As fotos eram afixadas no mural da empresa e enviadas por e-mail para todos da equipe. O funcionário com pior desempenho também era obrigado a dançar músicas constrangedoras na frente de todos, como "Eguinha Pocotó".
A empresa negou as alegações, mas depoimentos testemunhais comprovaram a exposição.
Condenação
O juiz de origem entendeu que a empresa ultrapassou todos os limites do bom senso, por expor o empregado ao ridículo e à chacota perante os demais colegas. "Ato repugnante, vergonhoso e humilhante e que beira ao absurdo, sendo, por óbvio, passível de indenização por dano moral," destacou. A empresa foi condenada a pagar R$ 50 mil a título de dano moral, sendo R$ 10 mil em decorrência das humilhações sofridas nas campanhas e R$ 40 mil pela caminhada sobre o carvão em brasas.
A distribuidora de medicamentos recorreu da decisão, mas o Tribunal Regional da 3ª Região (MG) manteve a condenação e negou o seguimento do recurso de revista.
TST
Em agravo de instrumento na tentativa de trazer o recurso ao TST, a empresa alegou que trabalhador não comprovou o dano sofrido e insistiu na tese de que o "treinamento motivacional de vendas e liderança" ocorreu dois anos antes do ajuizamento da ação. O pagamento de "prendas", segundo a empresa, era feito apenas por aquele que ficasse em pior colocação, e a entrega de carrinhos Ferrari ou Fusca representava "uma espécie de classificação nos resultados das vendas". Outro argumento é que a caminhada sobre a passarela com carvão em brasa não era obrigatória e não causou qualquer queimadura ou comprometimento da saúde e integridade física do trabalhador.
O relator do processo, ministro Walmir Oliveira da Costa (foto), destacou que a empresa pretendeu reabrir o debate em torno da comprovação do dano por meio de provas, o que é inviável de acordo com a Súmula 126 do TST. Além disso, o relator destacou que "não se pode conceber, em pleno século XXI, que o empregador submeta o empregado a situações que remetam às trevas medievais". O fato de o treinamento motivacional apresentar ao participante a possibilidade de caminhar por corredor de dez metros de carvão em brasa "é o bastante para constatar o desprezo do empregador pela dignidade humana do empregado".
O ministro destacou ainda que o acórdão do TRT deixou evidenciado o fato ofensivo e o nexo de causalidade, ou seja, sua relação com o trabalho. Para ele, o dano moral é consequência da conduta antijurídica da empresa.
Durante o julgamento, na última quarta-feira (24), o ministro Lelio Bentes foi enfático ao condenar a conduta empresarial.  "Fiquei chocado com a situação", afirmou. "É de se estarrecer que em pleno século XXI nos deparemos com condutas tão aviltantes e que demonstram tanta insensibilidade por parte do empregador."

O caso também foi encaminhado ao Ministério Público do Trabalho para as devidas providências.

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, 29 de setembro de 2014

Motorista não recebe em dobro por trabalho no carnaval e em Corpus Christi

Um motorista da Regra Logística em Distribuição Ltda., de Aparecida de Goiânia (GO), não irá receber em dobro os dias trabalhados no carnaval e Corpus Christi, tradicionalmente considerados feriados. A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho (TST) proveu recurso de revista da empregadora ao entendimento de que não existe legislação municipal estabelecendo feriado no período.
Em decisão anterior, o Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região (GO) manteve a sentença que determinou o pagamento em dobro. Para o Regional, o direito costumeiro é fonte formal autônoma do Direito do Trabalho, e a suspensão do trabalho no carnaval e no dia de Corpus Christi deve ser "reconhecida como válida, diante da sua prática reiterada, uniforme e geral". Acrescentou ainda que essa suspensão é fato notório, que independe de prova.
Ao examinar o caso, a ministra Delaíde Miranda Arantes, relatora do recurso no TST, explicou que os artigos 1º e 2º da Lei 9.093/95 dispõem, respectivamente, que são feriados civis os declarados em lei federal e feriados religiosos os declarados em lei municipal. "Embora exista a tradição em vários municípios estabelecendo o não expediente nas empresas, a legislação não trata o carnaval como feriado", ressaltou.

Ela apontou também jurisprudência da Segunda Turma, que, em caso semelhante, destacou que a terça-feira de carnaval não faz parte do rol de feriados nacionais enumerados no artigo 1º da Lei 662/49, com redação dada pela Lei 10.607/2002, concluindo ser indevido o pagamento em dobro, por não se tratar de hipótese de prestação de serviços em dia de feriado. Em relação ao dia de Corpus Christi, a ministra destacou que, diante da tese expressa pelo Tribunal Regional de Goiás, "infere-se não haver lei municipal em Aparecida de Goiânia definindo-o como feriado".

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, 29 de setembro der 2014

Servente não será indenizado por utilizar bicicleta para ir trabalhar


A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho não conheceu do recurso de um servente de pedreiro que pretendia ser indenizado por não receber vale-transporte. Sem possibilidades processuais de exame do mérito da questão, ficou mantida decisão das instâncias inferiores que julgou improcedente o pedido, pelo fato de que ele fazia o trajeto de bicicleta.
No recurso ao TST, o trabalhador alegou ser "injusto e ilegal" o indeferimento do vale-transporte, informando que residia a aproximadamente seis quilômetros de distância do trabalho e era obrigado a se deslocar ao trabalho de bicicleta. No entanto, ele não conseguiu demonstrar violação de preceito constitucional, dispositivo de lei federal ou divergência jurisprudencial que permitissem o conhecimento do recurso.
Contratado pela DH Construções Ltda. para trabalhar em obras da Construtora e Incorporadora Omni Ltda., o servente argumentou que nunca recebeu o vale, o que o impedia de utilizar transporte público. Na ação, requereu a indenização do vale não concedido e informou que, apesar de haver justificado que não tinha dinheiro para arcar com o transporte, foram descontados R$ 270 do seu salário por não ter comparecido ao serviço três dias.
Ao julgar o processo, o Tribunal Regional do Trabalho da 12ª Região (SC) destacou que a finalidade do vale-transporte é propiciar subsídios para a locomoção do trabalhador de ida para o serviço e de retorno para a sua residência, sendo devida a indenização substitutiva "quando o empregador não comprova a concessão dessa vantagem". Salientou, porém, que o servente confessou "que ia para o trabalho de bicicleta".
Essa circunstância, segundo o TRT-SC, impedia o acolhimento da pretensão de indenização. "O fundamento de qualquer indenização é a reparação ou compensação de um prejuízo, pressuposto inexistente no caso", concluiu.
O trabalhador apelou ao TST alegando violação aos artigos 7º, inciso XXVI, da Constituição da República, 1º da Lei 7.418/85 (que instituiu o vale-transporte) e 1º, inciso V, do Decreto 95.247/87 (que regulamenta o benefício) e divergência jurisprudencial.
Ao examinar o recurso, o ministro Renato de Lacerda Paiva, relator, explicou que as decisões apresentadas para o confronto de teses pelo trabalhador não tratavam da mesma situação. Acrescentou também que não constatou violação ao artigo 1º da Lei 7.418/85 nem afronta direta e literal da Constituição. Quanto à invocação de decreto regulamentador do vale-transporte, o ministro esclareceu que ele não está entre as hipóteses de cabimento do recurso de revista, previstas no artigo 896 da CLT. Quanto à alegação específica de que o trabalhador residia a aproximadamente seis quilômetros de distância do trabalho, observou que o TRT não firmou qualquer tese relacionada a tal premissa.

Fonte: Tribunal Superior do Trabalho, 30 de setembro de 2014